quinta-feira, 25 de junho de 2009

A linhagem do batismo.

“Arrependam-se e sejam batizados” é a primeira e mais exemplar porção do unguento que Lucas coloca na boca de Pedro para aplacar a ânsia da multidão transtornada pelo Espírito. Como que para endossar o seu caráter exemplar, a mesma fórmula reaparecerá, articulada de diferentes formas, em outros momentos-chave do livro.

A nós cabe a dupla tarefa de determinar o que essas palavras e suas demandas significavam para os que a ouviam naquela manhã, e examinar a fidelidade dessas demandas à postura e à herança do Jesus dos evangelhos.

Como se verá, os ouvintes de Pedro interpretarão a primeira injunção, “arrependam-se”, à luz da segunda, “sejam batizados”, por isso será necessário começar pelo batismo.

É importante que ao final sejamos capazes de reconhecer com clareza duas coisas. A primeira, mais evidente mas facilmente negligenciável, está em que ao dizer “sejam batizados”, Pedro não estava se referindo a (e muito menos exigindo) uma conversão voluntária e formal dos seus ouvintes ao cristianismo. Nesta altura da narrativa e da história o cristianismo não havia sido ainda inventado ou intuído em qualquer sentido importante. Os discípulos não haviam ainda ousado proferir ou apropriar-se da palavra igreja, e só daqui a duas ou três páginas (e em contexto diverso) os seguidores de Jesus serão chamados “pela primeira vez” de cristãos. O batismo como rito de entrada ao cristianismo não existia na forma de conceito ou de prática. Eram aqui judeus falando a judeus, alinhando o Deus e a fé que tinham em comum às suas mesmas promessas.

Em segundo lugar, e como que para compensar o que foi dito, aquela não era a primeira vez que os romeiros de Pentecostes ouviam o termo “batizar”. Sendo todos “judeus devotos”, podemos tomar como certo que não ignoravam as raízes profundas que a idéia de batismo (e de purificação com água em geral) tinha em sua tradição e sua prática. Quando expostos ao “sejam batizados” de Pedro, souberam ter uma idéia muito precisa do que ele estava falando e de suas implicações.

Em sua ênfase na santidade ritual, a Lei de Moisés estabelecia um enorme número de condições que tornavam pessoas e objetos “impuros” – isto é, inaptos para o serviço do Templo e dos sacrifícios. A impureza ritual era uma condição altamente contagiosa: um leproso era por definição impuro; a pessoa que tocava um leproso era contaminada pela sua condição e ficava ela mesma impura. Tudo que o imundo tocar se tornará imundo (Números 19:22).Tornava-se imediatamente impuro o homem que ejaculava, à mulher que menstruava e qualquer um que tocasse um cadáver, um osso ou um túmulo; mas tornava-se também impuro quem tocasse o corpo, a roupa ou a cama de qualquer um desses impuros de primeira instância.

Ao mesmo tempo em que esclarecia tantos e tão frequentes riscos, a Lei elencava uma série de provisões para a efetiva descontaminação de objetos e pessoas. Algumas dessas soluções envolviam a apresentação de sacrifícios, mas praticamente todas requeriam a purificação com água – seja por lavagem, aspersão ou imersão, ou ainda uma combinação desses três.

O homem que ejaculava devia “banhar seu corpo todo”, e a pessoa que tocava a cama de uma mulher menstruada devia lavar suas roupas e “banhar-se em água” (Levítico 15:16,21). Quem tocasse o cadáver de um ser humano ficava impuro por sete dias. No terceiro e no sétimo dia uma pessoa ritualmente pura devia derramar água viva (isto é, água corrente) num vaso que contivessse as cinzas de uma oferta pelo pecado; em seguida, com um ramo de hissopo, aspergiria essa água sobre a pessoa impura e seus pertences. Finalmente, no sétimo dia, o impuro devia “banhar-se em água”, e a partir do pôr do sol estaria limpo (Números 19:17-20). Depois de apresentar-se ao sacerdote e oferecer os sacrifícios requeridos, o leproso declarado limpo devia raspar todos os cabelos e pelos do corpo e em seguida “banhar o corpo em água” (Levítico 14:6-8,15-16).

O verbo hebraico para esse “banhar-se” é que foi traduzido na Septuaginta pelo grego baptizo – mergulhar, imergir, submergir, – o mesmo “batizar” que comparece no Novo Testamento e na instrução de Pedro.

A Mishná, compilada entre o primeiro e o segundo século mas fixando por escrito material muito anterior, registra as instruções complementares que a tradição estabeleceu para o cumprimento das variadas exigências da Lei. Sobre os banhos de purificação – os batismos – a Mishná explica que exigiam, em primeiro lugar, água suficiente para cobrir o corpo inteiro. Como nenhuma parte do corpo devia deixar de estar em contato com a água, o batismo de purificação requeria ainda a nudez completa; quando testemunhas eram requeridas, homens acompanhavam homens e mulheres acompanhavam mulheres. E segue estabelecendo dimensões ideais para as piscinas batismais e normas rigorosas sobre a qualidade da água que podia ou não ser utilizada.

Que era dessa forma que os judeus do tempo de Jesus enxergavam as necessidades do batismo fica claro pelo número de antigas piscinas batismais (mikvaoth) encontradas no Israel daquele período. Só em Jerusalém, e datando do primeiro século, foram encontradas 150. Os membros da seita dos essênios, que havia desenvolvido regras de pureza ainda mais exigentes (requeriam imersão completa caso um essênio fosse tocado por alguém de fora, ou mesmo por um membro inferior da comunidade) construíam, literalmente, seus edifícios ao redor de recursivas piscinas de purificação.

O requerimento principal para um estrangeiro que quisesse se converter ao judaísmo era a circuncisão, mas a partir do segundo século os textos começam a mencionar, como exigência adicional, o batismo de imersão e o sacrifício. O primeiro batismo do prosélito (isto é, convertido) representava (em conformidade com suas contrapartidas explicitadas na Lei) a sua transição do estado de estrangeiro impuro ao de judeu autorizado a entrar no Templo e participar do regime dos sacrifícios.

No tempo de Jesus não havia judeu que ignorasse, portanto, o verbo batizar, que representava em grego um conceito e um procedimento milenar da cultura hebraica.

Além de servirem para efetuar a purificação ritual dos que se submetiam a eles, todos os batismos de purificação, quer de judeus quer de prosélitos, tinham outra coisa em comum: eram invariavelmente realizados sem assistência pela pessoa que buscava a purificação.Ser batizado era uma novidade e uma contravenção. Mesmo quando havia testemunhas, a pessoa descia sozinha até a água e sozinha mergulhava de corpo inteiro, batizando a si mesma. Mesmo que não recorramos às regras explicitas da Mishná, o exame da linguagem de Números e Levítico deverá bastar para deixar isso claro (”deve banhar-se”, etc).

Mas então surgiu em cena um personagem que introduzia na tradição uma reviravolta, oferecendo um novo discurso e um novo procedimento. Ao invés de pregar que as pessoas deviam se batizar para alcançar a purificação, esse sujeito tomou os pés pelas mãos e começou a batizar as pessoas ele mesmo. Até aquele momento o que acontecia é que as pessoas batizavam a si mesmas; “ser batizado” era uma novidade e uma contravenção. Esse procedimento mostrou-se de imediato tão singular que rendeu ao seu proponente um apelido, o de “batizador” – o Batista.

Paulo Brabo, em A Bacia das Almas.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Leia essa notícia e me diga se esta ilustração não está correta! Infelizmente, são todos farinha do mesmo saco.


Se tivermos que errar, que cometamos erros novos, pelo menos! Chega dos mesmos!

domingo, 21 de junho de 2009

domingo, 14 de junho de 2009

A Voz dos Excluídos.

Veja a foto acima e responda: por que as pessoas não param para ouvi-lo?

a) Por que ele não está pregando sobre vitória financeira.
b) Por que ele não está com um terno da Colombo e sapato engraxado.
c) Com certeza ele não é um dizimista fiel e por isso está nessa situação.
d) É só um mendigo, o que ele sabe de Deus?
e) Se é um pastor tão bom assim por que não está pregando em sua mega-igreja?

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Evangélicos na Globo.

Só agora a Rede Globo descobriu aquilo que todo o cristão verdadeiro sabe: o Evangelho é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê.



(Veja mais matérias da série "Os Evangélicos" clicando no título do post).

Contingência e o vôo 447

O mundo está em choque. De novo a contingência mostra sua cara na tragédia do vôo da Air France. Vale lembrar: contingência significa que os acontecimentos não são sempre necessários. Quando ocorre alguma coisa sem uma razão que a explique ou justifique. Contingência gera imprevisto; fatos que escapam à engrenagem da causa e do efeito. Um avião cai porque o mundo é contingente, não porque tenha sido vítima do destino ou de um plano de Deus.

Diz-se no senso comum que as pessoas só morrem quando chega a hora. Caso isso fosse verdadeiro, o destino reuniu em uma aeronave as pessoas que deveriam morrer naquele dia. Isso daria à fatalidade um poder apavorante. Impossível pensar que gente de mais de trinta países entrou no vôo 447 sem saber que obedecia a uma força cega, que determinava aquele como o último dia de suas vidas.

Igualmente, acreditar que Deus permite a queda do avião porque tem algum propósito, soa esquisito. Cada pessoa, com histórias, projetos, sonhos, foi arrancada da existência para que se cumprisse qual objetivo? Um objetivo macro? Isto é, para que a humanidade aprendesse ou se arrependesse? Isso faria com que as biografias fossem descartáveis, desprezíveis. O Divino Oleiro, sem precisar se explicar, afogaria tanta gente para conduzir a macro história para o fim glorioso? Sim? Mesmo que exista esse deus, eu não o quero.

Também, algumas pessoas aceitam que Deus tem um plano para cada morte individual. Verdade, ele é Deus, tem todo o poder e é capaz de reunir, em um só lugar, quem deveria morrer. Mas também é bom. Então todos os passageiros foram eleitos para cumprir qual bem? Satisfaz pensar que o bem de ceifar tantas vidas, mesmo sem nenhum sentido do lado de cá, está garantido na eternidade? (Deus sabe o que faz?!?!) Como explicar tal conceito para pais, filhos e parentes desolados? Todos acorrentados à trágica realidade que lhes roubou de seus queridos.

A idéia de que Deus tem um plano para cada morte se esvazia diante dos números. Um avião caiu, mas o que dizer dos incontáveis acidentes de todos os dias? O que dizer das balas perdidas que aleijam transeuntes? E dos erros médicos ou dos acidentes de trânsito? Recentemente uma senhora de nossa comunidade caiu da laje da casa em construção. Ela fotografava a obra para que a filha ajudasse com as despesas do acabamento. Quebrou a coluna e ficou paraplégica. A última explicação que se poderia dar é que Deus tinha um plano em deixá-la paralítica.

Jesus nunca cogitou o mundo sem contingência. Pelo contrário, não atrelou a queda de uma torre aos desígnios divinos; não disse que a cegueira do homem era consequência causal das ações interiores, dele ou de seus pais; advertiu que os seus discípulos enfrentariam tempestade, aflição e morte.

Contingência é o espaço da liberdade, portanto, da condição humana. Sem contingência nos desumanizaríamos. A consciência do risco de adoecer e da imprevisibilidade da morte súbita é o preço que pagamos por nossa humanidade.

O desastre do avião mostra a inutilidade de pensar que o exercício correto da religião e a capacidade tecnológica mais excelente sejam suficientes para anular a contingência. Nossa vida é imprecisa e efêmera. Portanto, vivamos intensamente. Cada instante pode ser o último – Carpe Diem!

Soli Deo Gloria

Ricardo Gondim.


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